Nós, Filhos de Eichmann: Carta Aberta a Klaus Eichmann - Günther Anders
- Günther Anders
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Sinopse
Apesar de terem sido escritas há décadas, e de se endereçarem ao filho do oficial que administrava a máquina de extermínio nazista, as cartas reproduzidas neste livro possuem uma atualidade na menos que assombrosa. A seu interlocutor, Klaus Eichmann, primogênito de Adolf — caçado, julgado e condenado à forca por Israel no início dos anos 1960 —, o filósofo judeu Gu¨nther Anders esclarece que não quer remexer o passado, mas falar do futuro: “é necessário buscar aquelas raízes que não se extinguiram após o colapso do sistema do terror de Hitler e de seu pai”. Seu maior pesadelo é a repetição da monstruosidade, que para ele é resultado do avanço frenético da técnica e da incapacidade do ser humano de sequer imaginar a magnitude do poder de destruição que desenvolveu. Ao tentar convencer o filho a romper com a herança paterna, fica claro que Anders está falando a todos nós, conclamando ao pensamento crítico e à consciência sobre em que medida nossas ações cotidianas, nosso trabalho, a forma como inocentemente ganhamos a vida, contribui para a destruição do mundo — e do outro.
Para Anders, no mundo fordista o trabalhador já não conseguia imaginar os efeitos distantes de suas ações, dado o triunfo irrefutável do aparato técnico de produção. Assim, as piores atrocidades podem ser realizadas como se fossem um trabalho trivial, sem culpa nem remorso. Ou seja, todos poderíamos nos tornar cúmplices ou vítimas de uma máquina de extermínio. Isso não eliminaria a “oportunidade moral positiva”, diz Anders. No entanto, na medida em que a ideia de futuro se inscreve no tempo presente enquanto ameaça impessoal e permanente, a negação da ordem existente torna-se mais problemática, deixando-se de se processar nos termos próprios da norma progressista. Tanto assim que Anders se volta a uma militância “antiapocalíptica”, definida pela tentativa radical de adiar o horizonte de extinção da humanidade. […] O desencontro histórico entre a obra de Anders e o Brasil mereceria reflexão à parte, sobretudo agora que se recicla entre nós a fraseologia do capitalismo inclusivo, já quase inteiramente desprovida de função mobilizadora para a imaginação social e política. Se assim for, estas cartas a Klaus Eichmann ganham, finalmente, a chance de buscar seu destinatário brasileiro.
— Maurício Reimberg, na orelha