A Senhora das Especiarias - Chitra Banerjee Divakaruni
- Chitra Banerjee Divakaruni
- 304 Páginas
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Sinopse
Açafrão, pimenta do reino, fava de baunilha, curcuma. Tilo, a narradora de A SENHORA DAS ESPECIARIAS, de Chitra Divakaruni, conhece as propriedades mágicas de cada erva. Para cada cliente que entra em sua loja, em Oakland, ela tem uma receita singular. Tilo consegue ver o que mora no coração das pessoas - seus desejos e esperanças. Tilo nasceu na Índia e, após um longo ritual, passa a dominar os segredos do bom uso das especiarias. Ela poderá alcançar a imortalidade se, entre outras condições, jamais sucumbir a desejos carnais. Uma mestra precisa esquecer as próprias paixões. Mesmo tendo assumido a forma humana de uma velha, Tilo se surpreende quando o belo Raven entra um dia em seu bazar. Apaixonada, descobre subitamente sua fragilidade. Com seu texto poético, Chitra Divakaruni impregna de doce magia o cotidiano de uma cidade moderna. Com rara sensibilidade, traça um perfil da comunidade de imigrantes indianos, divididos entre seus valores tradicionais e o sonho americano. Divakaruni vem se destacando rapidamente no cenário da literatura mundial. A SENHORA DAS ESPECIARIAS, vendido para dez países, obteve grande sucesso nos Estados Unidos.
Resenha
Uma história de 1997 assustadoramente atual
" Talvez este corpo feito de fogo, de magia e de sombra já não sangre como o dos homens”
Há uns anos, aluguei o filme baseado nesse livro, O Sabor da Magia. O longa não faz jus ao encanto da narrativa escrita. Ela, por si só, lembra fábulas orientais, recantos mágicos secretos, o fantástico em sua forma mais pura; e, ao mesmo tempo, é capaz de nos conduzir a acreditar que essa magia está presente no cotidiano mais simples. Tilo, a protagonista, teve muitos nomes; dotada de dons estranhos e a figura de longos anos de aventuras inacreditáveis, tornou-se uma Mestra de Especiarias, relegada a uma pequena loja poeirenta em Oakland. Ela é encarregada de ajudar, através dos seus produtos, as pessoas que vem a seu encontro no estabelecimento. Com respingos de feitiços, consegue ver o que desejam e os problemas que enfrentam seus clientes imigrantes. Uma das regras que rege as Mestras é de jamais ceder as próprias vontades, doando-se de corpo e alma aos outros – e as especiarias.
Pimentas malaguetas para destruição, raízes de lótus para renovação, açafrão para renascimento... Elas conversam onírica e poeticamente com Tilo e segredam-lhe seus poderes ancestrais. Após conhecer Raven, um cliente solitário e misterioso, a personagem começa a conceder espaço ás suas vulnerabilidades, apegos e antigos erros. Ela desperta empatia justamente por ser absolutamente fantástica – uma jovem similar a deusas e beleza e poder, mas introduzida dentro do corpo encarquilhado de uma velha, presa a paredes de uma loja sobrenatural – e absolutamente humana ao mesmo tempo. Assume o passado errático, o egoísmo e vaidade e maldade, a arrogância da qual vai se desfazendo aos poucos ao aprender a ser humilde e frágil. Trata-se da busca de uma vida, a jornada acompanhada por vozes de serpentes, superstição e paixão.
A cultura indiana é o alicerce, a autora homenageia de maneira bela e consciente o país pelo conhecimento bem fundamentado dos usos das especiarias, as criaturas e deuses mitológicos e a vivência própria na Índia. O cerne das questões se encontra na imigração para a América, onde as noções de sonho americano (dinheiro, poder, luxo e embranquecimento) competem com as tradições profundamente arraigadas. A ajuda necessária de Tilo se justifica pelo preconceito do branco contra seu povo, a violência gratuita nas ruas, o desemprego, o temor ao constatar que a América vista como salvação agride diariamente. Também critica tradições cuja bagagem destrói famílias, de filhos novatos aos costumes que não herdam as mesmas ideias ultrapassadas. O tratamento as mulheres é amplamente discutido e criticado, o que eu não esperava em um livro razoavelmente velho. Casamentos arranjados, estupro e violência doméstica são trabalhados com delicadeza e sensibilidade, esclarecendo que, sendo cultural ou não, o descaso com o consentimento não pode ser tolerado em nenhum lugar.
Ao fim, as especiarias são o pano de fundo para uma fantasia que une o misticismo ao cenário moderno das ruas da cidade americana, em descrições e metáforas líricas de uma protagonista equilibrando-se entre os sortilégios e os problemas rotineiros, disputando com os poderes cósmicos do universo pelo que considera certo e por quem quer ser.
“(...) Muito vulgar, pois é essa a natureza da magia mais profunda. A magia mais profunda que reside no coração das nossas vidas cotidianas, um fogo trêmulo, se ao menos tivéssemos olhos para ver.”